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PiTacO do PapO - 'O Primeiro Homem' | 2018

NOTA 7.0

Fomos à lua. E daí?

Por Vinícius Martins @cinemarcante 


Lembro-me do espetáculo teatral ‘Nós na Fita’ de Leandro Hassum e Marcius Melhem, no qual eles comentam a ambição do alpinista em subir o monte Evereste. “Ele sobe a montanha e… desce”. Ele a sobe para descer. Encarado sob esse ângulo, o propósito perde seu charme e soa um tanto quanto ridículo. Tal meta é comentada ao final do filme no discurso do então presidente Kennedy, que enfatiza que fazemos as coisas porque podemos fazê-las, independente do quão absurdas às vezes possam vir a parecer. Talvez seja esse o principal motivador do diretor Damien Chazelle, que se tornou ainda mais ambicioso após receber o seu Oscar e decidiu trazer a equipe da Apollo XI para o patamar da mortalidade.

Chazelle, em sua escalada por apresentar o lado pessoal de um dos maiores feitos da humanidade, faz seu filme de maior distanciamento entre os protagonistas e o público. O luto não é sentido, nem o peso do cotidiano em si, uma vez que os principais fatores que humanizariam o maior ícone da astronomia do século XX são deixados de lado para expor os demônios internos dele e a forma como ele responde de maneira introspectiva às pressões da jornada ao desconhecido.


Falta alma aos personagens. A cada nova baixa na equipe, vemos um avanço de meses na narrativa e o choque da possibilidade de morrer em nome desse grande avanço revolucionário, dá lugar para a determinação em cumprir a missão de vencer os soviéticos na corrida espacial, quase como se Armstrong fosse um suicida em potencial ou um dos famosos pilotos kamikaze que fizeram o diferencial nas guerras mundiais. E mesmo apesar de a história ser conhecida e todos saberem o final, com a frase que volta a cabeça de todos ao ouvir o nome de Neil Armstrong, o filme se limita a entregar isso e nada mais. É tão ultrajante quanto acompanhar o planejamento de uma festa de aniversário e, após a entrega do bolo e do cantar dos parabéns, nada mais fosse servido e todos os convidados fossem obrigados a se retirarem; não há docinho, nem lembrancinhas, nem uma simples conversinha para despedir quem teve a consideração de vir. Fria e secamente, o filme se encerra tentando apresentar emoções subjetivas que ficam estampadas nos rostos do casal de protagonistas para a interpretação de cada espectador.

Porém, se falta humanidade ao blockbuster, sobra técnica e esforço em situar o público em situações claustrofóbicas. A fotografia aposta muito em remeter ao visual das filmagens caseiras dos anos sessenta, e o estilo de “câmera na mão” toma o filme quase inteiro. A própria resolução das imagens, que se aproxima bastante das câmeras amadoras da época com seus rolos 35mm (mas aqui com formato de tela de 70mm, só para constar), faz parecer por diversas vezes que o que se assiste é um registro caseiro. Há, inclusive, contornos característicos desse modelo e época, que formam finas linhas rochas em torno do objetos ou pessoas que se movimentam durante a filmagem (isso só pode ser percebido vez ou outra pelos cinéfilos mais atentos).

Um traço marcante desse tipo de registro, no entanto, é o uso intenso do zoom. As filmagens daquela época (como as do assassino do presidente Kennedy, por exemplo) são icônicas e facilmente reconhecíveis por terem uma forte puxada de zoom. Isso, nesse caso em particular, prejudica o filme ainda mais na proposta de criar um elo entre personagens e público para consumar uma aproximação entre eles, já que mesmo vendo tudo de perto não se sai da esfera de espectador, que acompanha tudo de longe, sem interferir na trama ou viver os dramas apresentados. A empatia foi a maior prejudicada por essa escolha. Além disso, há também o aspecto de tremedeira constante, que faz com que uma mínima movimentação da câmera pareça um terremoto de 7.2 na escala Richter. Se quiser um exemplo mais rápido e prático do que estou falando, assista ao clipe ‘Video Games’ da Lana Del Rey, cuja estética tem, em partes, essas mesmas características.

Apesar de bem construído e visualmente condizente com a época, é cedo para elevar a produção ao patamar de clássico contemporâneo como ocorreu de imediato com 'Whiplash’ e ‘La La Land - Cantando Estações’, que chegaram ao Brasil respectivamente em 2015 e 2017. Chazelle não deu, no fim das contas, um grande passo para si mesmo. Este é um triste caso de excesso de expectativas. Se eu estiver equivocado hoje, por talvez não ter compreendido o filme em seu cerne, e idolatrar tal obra no futuro, só o tempo me dirá. Por hora, o que fica é o frescor da indiferença.


Vale Ver !


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